quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Silenciosamente

Ela tinha sonhos, fazia projetos, perseguia seus objetivos e tinha muita alegria de viver.
Mesmo quando caía, sacudia a poeira e seguia em frente. Recomeçar nunca tinha sido um problema e o fazia com muita energia.
Tinha um namorado, se divertiam juntos e gostavam das mesmas coisas. A vida era boa.
Então, sua mãe morreu. Ela ficou triste, sentiu muito a morte dela, mas seguiu em frente, como sempre fazia, pois ainda precisava cuidar do velho pai.
Continuou seus projetos, continuou o namoro, e, apesar da tristeza e da falta que a mãe fazia, ainda tinha muita alegria de viver e a vida não chegou a ser difícil, mas era menos colorida.
Então seu pai morreu. O chão ruiu sob seus pés. Ele era seu porto seguro, seu confidente, seu amigo, mas como sempre tinha sido provedor, não lhe tinha ensinado a viver sem ele.
Sentiu dor. Entristeceu. Perdeu a alegria de viver. Rompeu com o namorado, que afinal, não foi o parceiro que ela precisava que fosse e desse modo, não tinha porque continuar.
Tudo ficou cinza, mas ela continuou trabalhando, só que não tinha mais o mesmo entusiasmo.
Recomeçar agora era um fardo. 
Os projetos foram deixados de lado e pouco a pouco, ela foi desistindo. Não fazia mais diferença, se estava engordando (e muito), ou se estava emagrecendo (o que não acontecia). 
Se alguém a chamava para sair, arranjava uma desculpa para não ter que se arrumar e sair de casa.
Fazia o básico, mas até isto lhe custava muito. Aos poucos foi deixando também de lado o trabalho.
Ficou prostrada, porque na verdade, apesar de ser adulta, não sabia que a perda do pai lhe causaria um dano tão grande e aos poucos, afastou-se dos amigos e deixou de sentir alegria.
A depressão se instalou silenciosamente e ninguém percebia. Ela sabia, mas não tinha ânimo para lutar contra, porque não tinha mais motivação alguma.
Engordou muito, deixou de se cuidar também e esqueceu que precisava viver.
Aos poucos, a erva daninha cresceu no quintal e dentro dela.
Em pouco tempo, deixou de procurar a si mesma e foi se esquecendo das coisas...
Foi ficando cada vez mais acabrunhada, cada vez mais triste e foi se tornando opaca, sem nenhum brilho.
Enquanto isto, as pessoas também foram se esquecendo dela e as sombras foram tomando os cantos da casa.
A única amiga que ainda mantinha contato por telefone teve uma discussão com ela, porque sempre que conversavam ela dizia que estava bem e ouvia com interesse sobre a vida da outra, mas nessa discussão a amiga que não podia avaliar sua dor (porque ela nunca falava de como se sentia), ficou magoada com o rumo da conversa e rompeu com ela.
Agora estava definitivamente só.
E foi para o quarto, chorou e dormiu. 
Quando o telefone tocou, não se levantou para atender, porque certamente era alguém para cobrar as contas atrasadas e não precisava mais pagar nenhuma conta.
Voltou a dormir profundamente.
E mais um dia se fez, mas ela não se lembrava se precisava se levantar e não se levantou.
E continuou dormindo, até que um dia, algum vizinho percebeu o silêncio sepulcral e chamou a polícia.
Quando forçaram a porta, ela estava morta há muito.
Silenciosamente deixou o mundo, porque sua única companheira a depressão, não a deixou um minuto sequer depois que se instalou.
Esta doença é um perigo, porque ninguém percebe quando ela se instala.
Cuide das pessoas a quem você ama, porque nem sempre se consegue perceber os sinais.

Boa noite!